A comissão especial da Câmara dos Deputados sobre a reforma administrativa rejeitou quase todas as emendas dos partidos da base aliada e da oposição e, com isso, concluiu a aprovação do projeto na madrugada desta sexta-feira (24). Das 27 emendas votadas, apenas uma, para tornar as guardas municipais uma força de segurança pública, acabou aprovada.
A proposta de emenda constitucional (PEC) agora precisa ser aprovada no plenário, onde o apoio precisa ser maior. Na comissão, bastava maioria simples dos 47 integrantes. Apesar disso, partidos governistas precisaram trocar seus integrantes, como MDB, PSD, PL, Republicanos, PSDB, DEM e PSL, para garantir votos favoráveis. No plenário, será necessário o apoio de 308 deputados para aprovar o projeto em dois turnos de votação.
Os parlamentares rejeitaram dezenas de emendas para alterar o parecer do deputado Arthur Maia, DEM-BA (na foto) sobre a reforma, como excluir as mudanças nos contratos temporários, a possibilidade de corte de 25% nos salários e jornada de trabalho dos servidores quando o ente público estourar os limites com gasto com pessoal e aposentadoria integral para os policiais que ingressaram na carreira até a reforma da Previdência, em 2019.
Ainda não há data para que o tema seja levado ao plenário, mas líderes partidários aliados ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), dizem que isso deve ocorrer já na próxima semana.
O texto-base foi aprovado na quinta-feira (23) por 28 votos a 18 e não incluiu juízes e promotores. Após mudanças no texto, como a manutenção da estabilidade para todos os servidores, os partidos de oposição, o PV, o Patriota, o Avante e o Solidariedade votaram contra o parecer.
A aprovação só ocorreu com folga após os partidos governistas promoverem mudanças na composição do colegiado. Na noite anterior, um requerimento para adiar a votação foi rejeitado por apenas três votos, 22 a 19. Após isso, PL, MDB, DEM e Republicanos trocaram seus representantes na comissão. O Novo, que tem oito deputados, ficou com sete vagas –quatro de titulares e três de suplentes (votam na ausência dos outros).
Para ter validade, a proposta de emenda constitucional (PEC) precisa ser aprovada também pelo Senado, Casa em que o governo enfrenta muito mais resistência e já derrotou outras iniciativas do Executivo este ano.
Alterações da proposta original
O projeto foi bastante alterado pelo relator, o deputado Arthur Maia (DEM-BA), em relação a proposta original do governo. A estabilidade foi mantida para todos os servidores, não foram criadas novas formas de vínculo com o serviço público e todas as medidas previstas na proposta de emenda constitucional (PEC) valerão apenas para os novos servidores.
A reforma determina que os novos servidores públicos da União, Estados e municípios não poderão ter férias superiores a 30 dias, licença-prêmio (90 dias de folga a cada cinco anos), adicionais por tempo de serviço e aposentadoria compulsória como modalidade de punição, entre outros “privilégios”. Para os atuais funcionários públicos, nada muda.
O relator incluiu entre as categorias que serão afetadas por essas vedações os parlamentares e membros de Tribunais de Contas (que são ligados ao Legislativo), mas os juízes e promotores do Ministério Público ficaram de fora. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), alegou que um parecer da Mesa Diretora da Casa declarou ser inconstitucional que o Congresso tratasse das carreiras do Judiciário – a iniciativa de propor as mudanças teria que partir deles próprios.
Lira e Maia costuraram um acordo com os partidos para que a emenda dos juízes e promotores fosse declarada constitucional, mas que eles só pedissem a votação no plenário, onde o quórum exigido para aprovação é maior.
Com a decisão de que nenhuma das regras valerá para os atuais servidores, o projeto não terá ganho fiscal imediato, mas trará uma despesa extra para a União e os Estados ao mudar regras de pensão por morte dos policiais em serviço e garantir aposentadoria integral para os policiais civis da União que ingressaram até a reforma da Previdência. Não há estudo de quanto será gasto com essas medidas, mas partidos fizeram emendas para excluir esses pontos.
Redução do salário e jornada de trabalho
A principal medida de impacto orçamentário é a redução do salário e jornada de trabalho dos servidores públicos em 25% quando for ultrapassado o limite de despesa com pessoal previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal (de 50% da receita corrente líquida para o governo federal e 60% para Estados e municípios). Os atuais servidores poderão optar por essa diminuição ou não, mas, no caso dos futuros funcionários públicos, ela será obrigatória.
O projeto também cria regras para a avaliação de desempenho dos servidores que, caso seja considerado insatisfatório, poderá ensejar a demissão. A PEC dá apenas diretrizes sobre como funcionará essa avaliação, como, por exemplo, ter a participação do usuário. Será necessária a aprovação de projeto posterior para regulamentar o funcionamento dessas provas. Ainda serão instituídas regras de gestão de desempenho dos serviços e órgãos públicos.
O estágio probatório, anterior à obtenção de estabilidade pelo servidor, terá seis avaliações ao longo dos três anos de experiência e, caso o desempenho não seja satisfatório em duas delas, o concursado não será efetivado. Hoje ocorre apenas uma avaliação ao fim do período.
Para o deputado Rogério Correia (PT-MG), a reforma enfraquece os servidores e o serviço público, além de manter privilégios da elite do funcionalismo público. “Não haverá mais denúncia de corrupção, como ocorreram agora no SUS e na compra de vacinas, porque o servidor terá medo de perseguição”, disse. “Trocar servidor concursado por apadrinhado é avanço, é modernização?”, concordou o deputado professor Israel Batista (PV-DF).
O deputado Tiago Mitraud (Novo-MG) criticou os parlamentares que votaram para “agradar sindicatos” e defendeu que o projeto é positivo, apesar de pontos negativos que ele defendeu alterar por emendas. Ele destacou a instituição da avaliação de desempenho, a ampliação dos contratos temporários e a criação de regras para demissão por obsolescência do cargo.
O relator defendeu que o texto não é mais o do Executivo, mas construído por todos os partidos no Congresso, e irá modernizar o serviço público. “Quem tem medo de avaliação de desempenho? Apenas os maus servidores. Na iniciativa privada, todos são avaliados o tempo inteiro. É justo dar à população poder de avaliar o serviço que ela mesmo paga”, disse.
Fonte: Valor online